17 abril 2011

Espelho meu, espelho meu, haverá alguma princesa mais excêntrica do que eu?

ou "tudo o que sempre quis saber sobre princesas, mas teve medo de perguntar"


LECHERMEIER, Philippe e DAUTREMER, Rébecca (il.), Princesas Esquecidas ou Desconhecidas, V.N. de Gaia, Editora Educação Nacional, 2007, pp. 95

Comprar e recensear este livro de Philippe Lechermeier e Rébecca Dautremer cria vários problemas. Por um lado (e começando com a recensão), requer um esforço tremendo para conter o excesso de verborreia, de adjectivação positiva, a transcrição ipsis verbis das inúmeras frases memoráveis e a colagem exaustiva de imagens — como podem ver, nem a contenção se apregoa com parcimónia... Por outro, ao comprar o livro e folheá-lo, deparamo-nos com três grandes dilemas (sim, é um problema comum referido em inúmeras outras recensões); primeiro, o livro é lindo, dá vontade de o expor na mesa da sala, como objecto de arte que é, segundo, embora seja para um público mais velho — a partir dos 8 anos —, imaginá-lo a ser lido no chão, na cama, manuseado com a familiaridade que se deve, transportado de um lado para o outro, etc. é o pesadelo de qualquer adulto — é uma obra de arte!—, e, por fim, há ainda que refrear os instintos assassinos que nos impelem a escortanhar o livro todo para fazer quadros para pôr nas paredes. Enfim... é um DESSES livros.

Posto isto, este livro de princesas, não é, de forma alguma, mais um livro de princesas, é O livro DAS princesas. Como já foi referido, o público-alvo será, provavelmente, constituído por raparigas a partir dos 6/7 anos, mas são as mais velhas — 8 a 10 — que vão conseguir explorar melhor as várias leituras possíveis desta obra. Grande — maior que um A4 e com 95 páginas —, as Princesas Esquecidas ou Desconhecidas estão organizadas de forma enciclopédica. Cada página corresponde a uma ou duas princesas e, quase sempre, temos o texto na página par e a ilustração correspondente na página ímpar. A cada entrada corresponde também uma frase/citação/máxima da autoria de Philippe Lechermeier. Embora sejam todas dignas de nota, citamos algumas, para melhor ilustrar o tom deste livro:

"Sonhar é contar histórias que ainda não se conhecem.", p.10 (Preguiçosa)

"Um capricho não é mais do que uma faísca de mau humor.", p.22 (Caprichosa)

"Quando me esqueço de algo, é uma ideia a brincar às escondidas dentro de mim.", p.36 (Amnésia)

No que toca a estas princesas que a história esqueceu ou ignorou, há para todos os gostos, de todas as etnias, boas, más, bonitas, feias, tagarelas, mimadas, ou apenas excêntricas. Escrito com muito humor, este livro será uma desilusão para as meninas mais pequenas que ainda vivem no mundo das princesas perfeitas cor de rosa e cintilantes das histórias mais tradicionais. No entanto, para as que já estão a ultrapassar essa fase será uma descoberta fascinante, tanto pelas inúmeras leituras possíveis, como pelo estímulo que proporcionam à criatividade e imaginação. O que é apresentado aqui é um mundo sem as características fronteiras do real ou do credível, onde se pode fazer humor sobre nós próprios e sobre as convenções, sem por isso as estarmos a criticar ou rejeitar. 
No entanto, esta enciclopédia não se limita às personagens que trata, é um trabalho exaustivo sobre tudo o que as rodeia e o seu mundo. Como todos sabemos a história da vida de uma princesa começa no berço, e é exactamente essa a primeira entrada, que nos elucida sobre a concepção e apresentação aos amigos da família de tão ilustre criatura, seguem-se ainda espaços tão importantes como a floresta, o jardim ou o amuadouro, personagens como a madrasta, o príncipe ou a confidente, os animais de estimação, os brasões, entre muitos outros. 
No final, encontra-se ainda um guia prático com truques e astúcias para "distinguir uma verdadeira princesa de uma falsa", "acordar princesas adormecidas", ou "calar uma princesa", anúncios de cursos, alugueres e moradas úteis, um teste, provérbios —"É preciso desconfiar da princesa que está a dormir" (provérbio de Grimm), p.88 —, um léxico de expressões usadas pelas princesas — "Ter um sapo ao lume: Estar com pressa, atrasada", p.89 —, uma bibliografia e vários índices. 
De louvar é ainda a tradução/adaptação, da autoria de Lucília Carvalho,  deste difícil texto recheado de intertextualidades, remissões, rimas internas e frases irónicas com segundos sentidos.

"As princesas são contagiosas" (Provérbio surrealista, p.88) e acredite que este é, sem dúvida um dos livros que faltam na biblioteca das suas filhas — ou até mesmo na sua. Depois de saber que existe, acha que pode sobreviver sem saber o que esconde a torre da princesa, como é que se usa uma amuadeira, quais os segredos da famosa princesa com ervilhas?

Viagens, pp. 42-43
"Ser a mesma noutro lugar muda tudo"

Confidente, pp. 34-35 
"Os segredos estão guardados mas o seu único desejo é fugir"

Princesa das Areias, pp. 48-49
"Um dia recolhi no meu jardim o véu vermelho de uma princesa longínqua"

Ólhameh, pp.82-83
"Um dia tão luminoso como uma estrela na noite" 

Se quiser saber mais sobre o livro, pode consultar o site em inglês. Ambos os autores têm páginas pessoais: Philippe Lechermeier (em francês)  Rebécca Dautremer (em francês ou inglês).

De ambos existe ainda o Diário Secreto do Pequeno Polegar também da Editora Educação Nacional que será objecto de um post nas próximas semanas.

1 comentário:

  1. Muito bom msm... esse livro é lindo!!! Amei o blog... Parabéns!

    Bjitos!

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